6 de março de 2017

Amar pelos dois.

Em 74 levámos "E depois do adeus", canção que dispensa apresentações e que marcou a nossa história. Três pontos na final, décimo-quarto lugar. Em 76 levámos "Uma flor de verde pinho", poema sublime de Manuel Alegre, interpretado pelo enorme e eterno Carlos do Carmo. Dois pontos na final, décimo-segundo lugar. Em 84 levámos "Silêncio e tanta gente", um "one woman show" de Maria Guinot absolutamente impressionante. Trinta e oito pontos na final, décimo-primeiro lugar.

Canções maravilhosas, ignoradas no grande "show" da música europeia. Canções-balada, cantadas em português. Também já levámos canções animadas como "A festa da vida", "Playback", "Conquistador" ou "O meu coração não tem cor". Salvo esta última, os resultados não foram muito melhores para este "tipo" de canções. Por isso, no dia em que alguém conseguir definir o que é "uma canção de festival", poder-se-ão classificar segundo esse critério as nossas participações. Enquanto isso não acontece, penso que a canção da Luísa e do Salvador é simplesmente uma belíssima balada de amor, digna representante da maravilhosa música que se faz no nosso país.

18 de janeiro de 2017

Dona do tempo.

Vivemos a correr, embrenhados nos nossos problemas, nas nossas lutas diárias, ou até na preguiçosa e enfadonha rotina de quem vê nascer e pôr-se o sol sem que nada de novo aconteça. Às vezes vivemos momentos que são como efémeros raios de luz, manifestações espontâneas da beleza do mundo, viagens, celebrações, conquistas, abraços apertados que nos aconchegam na certeza de que há sempre algo de bom para recordar. Vivemos sem tempo para nada, e sobretudo sem tempo para pensar que controlamos muito pouco do que acontece à nossa volta e até connosco. Deixamos para amanhã tudo o que não nos apetece fazer hoje, porque amanhã é outro dia. Trabalhamos mais horas do que devíamos porque tudo é urgente e nada pode ficar para trás, ou para amanhã. Pensamos ao longe naquele reencontro prometido, naquele abraço que ficou por dar, naquelas vezes em que não esperámos pela resposta ao habitual "tudo bem?". Vivemos como se fosse para sempre, às vezes com medo de que não seja, mas sempre a acreditar que há-de haver tempo.

E às vezes de repente a vida vem e dá-nos uma chapadona daquelas mesmo bem assentes, deixa-nos sem palavras e recorda-nos que é ela quem manda. No tempo e em (todos) nós.

14 de outubro de 2016

Serei quem quiser ser.

São 00:53 e calculo que sairei do laboratório por volta das 01:15-01:30. Hoje cheguei às 7:45, parei uma hora para almoçar e vinte minutos ao fim da tarde para comer alguma coisa e tirar as lentes de contacto, para poder continuar sem que os meus olhos se queixem demasiado. Na quarta-feira passada foi idêntico. E em tantos outros dias.

Doem-me os olhos de tantas horas passadas no escuro a olhar para órgãos diminutos, para um microscópio e para um ecrã. Doem-me as costas de tanto tempo sentada, nem sempre na melhor posição, em tarefas minuciosas, que exigem que as minhas mãos não tremam, mas tremem. Ao fim de mais de 12 horas, não consigo fazer com que não tremam.

Triplico a atenção em cada passo, em cada mínima tarefa, porque sei que o meu corpo e o meu cérebro me podem trair. Depois de um dia tão longo, não posso estragar tudo agora. Sigo o protocolo, abro bem os olhos que pedem descanso, controlo todos os passos.

Amanhã é sábado mas hei-de cá voltar, umas horas, para acabar o ensaio. Com a mesma vontade, a mesma curiosidade, a mesma ilusão de quem está a começar, ainda que já sejam cinco anos desta vida.



A um dado momento, disseram-me, repetidamente, que provavelmente este caminho profissional não era o meu. Que não tinha o que era necessário, que não era suficientemente rigorosa, organizada, até dedicada para poder fazer investigação científica. Em dias como hoje, permito-me discordar.