14 de outubro de 2016

Serei quem quiser ser.

São 00:53 e calculo que sairei do laboratório por volta das 01:15-01:30. Hoje cheguei às 7:45, parei uma hora para almoçar e vinte minutos ao fim da tarde para comer alguma coisa e tirar as lentes de contacto, para poder continuar sem que os meus olhos se queixem demasiado. Na quarta-feira passada foi idêntico. E em tantos outros dias.

Doem-me os olhos de tantas horas passadas no escuro a olhar para órgãos diminutos, para um microscópio e para um ecrã. Doem-me as costas de tanto tempo sentada, nem sempre na melhor posição, em tarefas minuciosas, que exigem que as minhas mãos não tremam, mas tremem. Ao fim de mais de 12 horas, não consigo fazer com que não tremam.

Triplico a atenção em cada passo, em cada mínima tarefa, porque sei que o meu corpo e o meu cérebro me podem trair. Depois de um dia tão longo, não posso estragar tudo agora. Sigo o protocolo, abro bem os olhos que pedem descanso, controlo todos os passos.

Amanhã é sábado mas hei-de cá voltar, umas horas, para acabar o ensaio. Com a mesma vontade, a mesma curiosidade, a mesma ilusão de quem está a começar, ainda que já sejam cinco anos desta vida.



A um dado momento, disseram-me, repetidamente, que provavelmente este caminho profissional não era o meu. Que não tinha o que era necessário, que não era suficientemente rigorosa, organizada, até dedicada para poder fazer investigação científica. Em dias como hoje, permito-me discordar.

22 de julho de 2016

Em círculo.

Fomos Nova Iorque, 11 de Setembro, estarrecidos.
Fomos Madrid, 11 de Março, confusos e surpreendidos.
Fomos Londres, Oslo, Boston, Paris, Ancara e Bruxelas.
Fomos Charlie porque nos tocava,
Aylan porque nos chocava.

Mas esquecemos.

Todos os dias nos esquecemos de ser paz, abraço, abrigo, amor.
Combatemos a guerra de armas nas mãos,
sem nos darmos conta que a estamos a alimentar.
Combatemos o medo de insultos na boca,
sem nos darmos conta que o estamos a semear.

Há tanto ruído que já não ouvimos,
já não nos escutamos.

Quando é que falar se fez mais importante do que ouvir?
Quando é que fugir, esconder, proteger,
se tornaram mais importantes do que estar, olhar, arriscar, SENTIR?

Fomos tudo sem ser nada.
Fomos tudo o que o mundo quis ouvir,
nada do que um dia,
ao olhar para trás,
gostaríamos de ter sido.

Porque no meio do barulho,
das vozes,
dos insultos,
das armas,
do medo,

no meio do medo tem que poder continuar a florescer o amor.

No meio de nós,
no meio do nosso medo de sucumbir,
têm de persistir uns braços abertos,
entregues,
confiantes,
ousados,
diferentes.

Se continuarmos a virar nas mesmas esquinas,
nunca mudaremos o nosso destino.

[12.4.2016]

13 de abril de 2016

Nosotros

La poesía es una casa abierta al mar,
amplia, luminosa y llena de oportunidades,
llena de paredes en blanco donde vaciarnos.
La poesía es la mirada sobre el mar,
que nos inspira y nos baña en sal,
capaz de conservarnos hasta la última sonrisa.
La poesía es la búsqueda eterna
por otros habitantes para esa casa,
dejando anúncios en verso para quien quiera leerlos.
La poesía es una niña que brilla como el sol
aunque prefiera esconderse en la sombra,
es el color vivo de tu sonrisa,
la simplicidad del acto de barrer,
y limpiarnos de presunciones.
La poesía es una llama encendida de repente,
una voz levantada del silencio,
un cuerpo tumbado en el suelo,
una carcajada liberada de lo más fondo de mi.
La poesía es el fuego de todos los cañones
en el revólver de nuestras almas
y saber que, noche tras noche,
entre amigos, versos y abrazos,
reímos en silencio
para no espantar la felicidad.

[12.4.16]

4 de março de 2016

Crónica de uma vitória (não) anunciada.

Sempre fui uma miúda gordita. Às vezes gorda, às vezes gorduchinha, às vezes (cuidadosamente) "forte" (para evitar possíveis constrangimentos). Nasci gordinha, aprendi mais tarde que aos bebés como eu nos chamam "macrossómicos" (coisa fina, isto de ter categoria especial logo à nascença!). Cresci gordinha e o cuidado dos meus pais, guiados pela sábia mão de uma grande nutricionista, corrigiu o problema hoje tão em voga - a obesidade infantil. Não me lembro de fazer dieta quando era pequena, mas de todas as histórias que já me contaram, acabo por ter imagens desse tempo na minha cabeça. Também por isso, não me lembro se foi um sacrifício muito grande ou não, não recordo sofrer com esse assunto - e isso é a melhor parte. No entanto, recordo ter lutado com o meu peso durante todos estes quase 29 anos. Às vezes pela mão dos meus pais e da nutricionista, às vezes confrontada com o "corpo inadequado" para a ginástica rítmica (desporto que ainda hoje adoro e admiro, quase 15 anos depois de ter deixado de o praticar), às vezes consciente dos perigos da obesidade, às vezes conformada com o meu "ser gordinha" e de cabeça erguida porque "sou como sou e não como me vêem". Fazia desporto, era saudável, não comia muitas "porcarias" - comia muito. Muito de tudo, muito das coisas que mais gostava, muito de todos os nutrientes, muita comidinha mesmo.

Então fui para a Faculdade e o ponteiro da balança deu um salto de 10 kg. Tinha deixado de fazer desporto, de ter horários, de almoçar e jantar em casa todos os dias. Tinha começado a viver a vida académica ao máximo e isso implicava nem sempre ter tempo para jantar entre as aulas e a reunião da AE ou o ensaio das Sirigaitas e por isso comer qualquer coisa no bar mais próximo. Jantaradas, reuniões de amigos, ensaios, festivais, zero cuidados e muita "boa vida". Só consegui recuperar (pouco) no último ano, com os horários do estágio que me permitiam voltar ao ginásio regularmente. Pelo meio tentei fazer desporto, tentei a ajuda de outra excelente nutricionista, mas o problema não eram as ajudas, o problema era eu e a minha pouca força de vontade. E este problema continuou a agravar-se em Londres e em Santiago, com tentativas falhadas de perder peso, com compromissos (muito) irregulares com o ginásio, com a vida social que sentia que estava a perder de cada vez que me comprometia a cuidar do meu peso. Enfim, a mesma luta de sempre. E a mesma desculpa de sempre - a minha vida não me permite fazer dieta, enquanto não acabar esta tese não vou conseguir perder peso.

Em Agosto de 2015 decidi (confesso que com pouca fé em mim mesma) tentar outra vez. Com a ajuda de outra grande nutricionista, com um enorme desafio pela frente, com vontade mas com medo de falhar, outra vez. Não foi por saúde, talvez nem por estética, foi mesmo por prevenção. Pensei que a recta final do doutoramento era a pior época possível para começar uma dieta, mas enganei-me. Uma vez mais, o problema era apenas a minha determinação. E essa, felizmente, desta vez não me faltou. Comecei a pôr em prática o plano alimentar e veio logo uma série de "asneiras": uma visita de um grande amigo a Santiago, um fim-de-semana em Madrid, outro nas Astúrias, outra visita em Santiago, enfim... Mas durante a semana era rigorosa. Voltei ao ginásio comprometida com as (fantásticas) aulas de jump e fui andando, tentando, persistindo. Afinal, não era assim tão difícil, não custava assim tanto, não me sentia nada culpada quando "deslizava" e por isso não o fazia assim tantas vezes.

Ontem (excepcionalmente, porque prefiro fazê-lo apenas quando vou à consulta), subi a uma balança. Era daquelas antigas, analógicas, talvez por isso me senti mais confiante - parece que a probabilidade de erro é menor nesse tipo de balança. O ponteiro marcou um valor que era o mais baixo que recordo nos últimos 10 anos. Em 6 meses, livrei-me de aproximadamente 14 kg (quase 3 garrafões de 5L de água, como diz a Dra. Luciana!) e sinto-me óptima. Este caminho ainda não acabou e a luta em si creio que durará toda a vida, mas pela primeira vez em muito tempo, vou eu à frente. E confio que vou ganhar.

29 de fevereiro de 2016

"Una luz distinta"

Quería hablarte de todo lo que fui antes de ti,
de los días grises sin fe
y de las mañanas verdes de esperanza.
Quería decirte que intento ser yo en cada instante,
pero la vida cambia y nosotros con ella.
Y por eso a veces no sé bien quien soy,
quien fui antes de ti o quien quiero ser ahora.

Quería contarte mis conquistas,
llorarte mis derrotas,
narrarte mi historia poco a poco, sin prisas.
Quería llevarte a mis memorias,
pasear contigo por mis recuerdos,
mostrarte el camino que he recorrido sin ti,
antes de ti, esperando por ti, buscándote a ti.

Pero en el fondo de tus ojos color tierra, profundos,
veo como buscas en lo más fondo de mi
los detalles de quien soy ahora, contigo.
Y en tu mirada intensa olvido el pasado,
me desintereso de explicarte quien fui,
pierdo el miedo de no encontrarme
y empiezo a reescribirme, hoy.

Porque nunca nadie me había mirado así,
con tanto futuro en los ojos.

[07.11.15]


Parabéns, a ti que és uma luz distinta. Que vieste mudar o meu guião, que vieste mudar-me e iluminar-me um pouco mais os dias. Parabéns! :)

19 de janeiro de 2016

Os Nomes.

Quero ensinar-te os nomes das coisas,
virar tudo do avesso e inventar palavras,
só nossas.
Palavras que sussurremos às escondidas como segredos,
que servem apenas para desvendar outros maiores,
os do mundo.

Quero ensinar-te os nomes das pessoas,
mostrar-te que todas elas valem por si próprias,
únicas e sós.
Sós até que alguém como tu as encontre
e lhes peça para aprender novas palavras,
só vossas.

Quero ensinar-te o nome do mundo,
imenso e distinto em todo o seu esplendor,
completo.
Para que te lembres sempre que as palavras são armas
e que tudo tem o seu nome, mesmo que seja inventado,
mas nosso.

Quero ensinar-te que os nomes são dignidade.
Quero ensinar-te a amar cada nome, cada coisa, cada pessoa.

[05.05.15]

14 de janeiro de 2016

Coração florido

Cresci num tempo em que se banalizou a palavra amor. Dizia-se "amor" por tudo e por nada, a uma quantidade razoável de pessoas nas nossas vidas. Os mais velhos olhavam-nos como se aquela simples palavra, usada como substantivo ou como verbo, conjugada nas mais variadas pessoas, fosse um tesouro precioso, um vinho "reserva" que só se bebe nos "dias especiais" (sim, essas garrafas que todos acabamos por herdar de pais e avós que nunca consideraram um dia suficientemente especial para esse vinho). Olhavam-nos como se estivéssemos a desperdiçar amor, a gastar a palavra e o sentimento, a esgotar uma fonte invisível.

Eu, no entanto, que nem era tão habitual no uso da palavra, sempre pensei como era egoísta essa histórica e tradicional contenção do amor. Se nesse momento da nossa vida, nessa circunstância particular, é amor o que sentimos pela(s) pessoa(s) que temos à nossa frente, porque haveríamos de o conter? Se não for por timidez, não vejo motivo para não dizer amor, mostrar amor e ser amor para quem realmente amamos. E há tantas pessoas que passam pela nossa vida deixando e levando amor... Tanta gente que amamos, amámos ou amaremos de pleno coração. Tantas pessoas que enchem os nossos dias da certeza de sermos amados, que é, para mim, a base da felicidade. Porque não o dizemos?

Hoje, encontrei neste blog esta versão de uma canção eterna. Tudo se resume a esta pequena frase: "Se eu não te amasse tanto assim, talvez perdesse os sonhos dentro de mim e vivesse na escuridão..."

Por isso, a todos os que têm enchido a minha vida de luz e sonhos, saibam que tudo seria diferente se eu não vos amasse tanto. Porque o amor não pode ficar por dizer. Por mais que o vento leve as palavras, "amor" é das poucas que tem a capacidade de se gravar em nós para sempre. Contra ventos e marés.

5 de janeiro de 2016

London love.

Faz hoje cinco anos.

Cheguei à cidade sonhada numa tarde-noite cinzenta, de chuviscos leves, como que a lembrar-me que às vezes os "clichés" também marcam presença no nosso dia-a-dia, para garantir que o mundo continua a girar na direcção habitual. Chovia em Londres mas em mim o sol era intenso, luminoso, ardente. Anos antes, em passeio, tinha prometido a mim mesma, olhos postos no horizonte atrás de St James Park e de Buckingham Palace, que um dia havia de viver naquela cidade que me conquistou. Faz hoje cinco anos, esse foi o dia.

Tenho saudades de Londres quase todos os dias. Deixei naquela mágica amálgama de ruas uma parte muito importante do meu coração. Gravei naquelas paredes, naquelas calçadas, o meu nome e a minha alma. Londres não se lembrará de mim, uma mera habitante passageira, mas eu jamais esquecerei aqueles seis meses de sonho. Ainda hoje não consigo explicar o que me une àquele lugar, mas continuo a sentir que hei-de regressar. Muitas vezes.

Fui incrivelmente feliz naqueles seis meses. Conheci pessoas maravilhosas, que ainda hoje tenho o privilégio de poder abraçar, de vez em quando, quando os complexos caminhos da vida nos voltam a reunir aqui ou ali. Conheci lugares mágicos, recantos escondidos, cores únicas, sons perfeitos. Trago nos meus passos o mapa dos caminhos que percorri, com a certeza que voltar a andar por ali me trará lágrimas aos olhos.

Faz hoje cinco anos, parece que foi ontem, quem sabe se não será "amanhã".

Thank you so much, my dear, my beloved, eternal capital of my heart.

4 de janeiro de 2016

Sabor a recomeço...

Acabou 2015 e eu fiquei com vontade de mais.

Ao contrário dos dois anos anteriores, que tinham sido duros, cheios daquelas preocupações pequeninas (e não tão pequeninas) que nos vão minando a coragem e que vão fazendo com que seja difícil ver o lado bom das coisas, 2015 foi doce. Foi suave, alegre, sorridente, tranquilo, feliz. Claro que houve dificuldades e obstáculos e lutas. Mas se pensar na sensação com que fico deste ano foi, claramente, a de um ano doce.

Em 2015 dei aulas (práticas), "tive" alunos pela primeira vez e soube o que era esse sentimento de realização pessoal. Com coisas simples, porque é delas que se faz a vida, pois claro! Soube que esse é o meu objectivo maior e que, de alguma forma, lá chegarei. Em 2015 escrevi muito, muito mais poesia do que prosa, muito mais poesia do que alguma vez tinha escrito na vida, muitas mais palavras tiradas cá de dentro a conhecer a luz do dia. Em 2015 também cantei mais. Cantei em público, conhecido ou nem tanto, cantei com medo, cantei com confiança, cantei com um sorriso na alma, porque quem me dera que a vida pudesse ser só cantar. Em 2015 mudei a minha forma de ver e tratar a comida, dei uma volta às minhas rotinas e finalmente comecei o processo que há anos devia ter tido começo. O caminho é longo mas uma parte já está percorrida e, sobretudo, uma parte fundamental já está conseguida - a mudança de hábitos. Em 2015 ganhei um "sobrinho", vivi o casamento de grandes amigos, celebrei o amor e a vida e a alegria de estarmos juntos, que é motivo mais do que suficiente. Despedi-me de amigos, voltei a abraçá-los, visitei-os, recebi-os, quase os "perdi", comecei a recuperá-los. Partilhei mil e um momentos inesquecíveis com as pessoas que mantêm unido o meu coração disperso pelo mundo. Em 2015 comecei um novo caminho, encontrei um abrigo especial, um espaço noutro coração para repousar o meu. Aprendi que tudo se renova, tudo se resolve, tudo se encontra. E que a forma mais eficaz de ser feliz é sempre simplificar.

As expectativas são altas e a resolução de ano novo foi só uma: encontrar-me mais com as minhas pessoas, física ou virtualmente, estar mais perto. Que 2016 seja doce, pelo menos tão doce...